29 agosto 2007

'Museu Berardo' traz o playboy de subúrbio aos museus.


Como sempre, deixei a poeira assentar [neste caso não demasiado, porque não me admira que a poeira voe em breve] e visitei o 'Museu Berardo', que aloja obras do homem sobre o qual mais se fala em Portugal, seja pelo BCP, pelo Benfica, pelo Museu, ou simplesmente porque não pára de aparecer na imprensa, em estilo readymade.

O CCB, aka 'Centro Cultural Berardo', para alguns 'centro comercial', trouxe uma novo cenário para os museus em Portugal.

Acabou a ideia de sossego associada a um vigilante de museu: agora, o CCB está em estado de sítio -- os visitantes não ligam nenhuma às linhas que no chão indicam a distância a ter das obras, urram de um lado para o outro das galerias, ouvem-se crianças a chorar, ou a correr, ou a mexer nas obras. Ou a arrastar-se pelo chão, o que vendo bem, até pode ajudar a quem iria limpar o pó. Só faltavam pitbulls e um chuning.

Mas o público do CCB não ficou maluco. O que acontece é que a fauna que por lá se vê, para citar uma amiga minha, não é nada do que se vê normalmente num museu. Quem ia, deixou de ir. Quem vai, estava normalmente num qualquer subúrbio.

Berardo deve pois estar satisfeito: o objectivo de trazer o 'povo' ao museu fica cumprido, pelo menos até ao fim do ano, porque a entrada é grátis.

O que achei adorável é que, como disse um amigo meu, 'esta gante nem olha para os quadros, tão preocupada está em tirar uma boa foto'. Outra amiga dizia que havia pessoas a cheirar a vinho [coisa que não confirmei, embora visse narizes encarnados em velhinhos de boné não muito diferentes daqueles que vieram de Cabeceiras de Basto aplaudir António Costa no Altis, após as eleições para a CML, sem saberem bem do que -- e de quem -- se tratava].

O museu deixou de ser um local de contemplação de arte para ser um local de turismo, onde se tira uma foto para por no screensaver do PC umas semanas, ou num álbum, ou num folder perdido no computador, ou colado ao frigorífico.

A experiència não é ver arte: é tirar umas fotos. E depois olhar para elas.

Mas o que é mesmo impressionante neste Museu Berardo é, e ainda no domínio da sociologia, que as fotos não são das obras em si, mas das pessoas que visitam o museu. Fotos dos filhos desdentados a dizer adeus ao lado de umas latas de Campbell soup, ou do pai trintão e de barba por fazer ao lado de um David Hockney.

Ou até de toda a família [chamaram-me a atenção quando ouvi o bip-bip-bip do temporizador da máquina], colocando um a camera e correndo todos para o pé de um quadro qualquer a dizer adeus ou a fazer caretas, ou a fingir que seguram um quadro, ou que são eles próprios parte do quadro.

Essencialmente, os portugueses deram função ao Museu Berardo: substituir a extinta Feira Popular.

Não digo que não; pelo menos quando passar ao lado o edifício não me faz tanta impressão. Mas também eu não ia ao Campo Grande...

O que gostei? O logotipo da Fundação Berardo, embora demasiado semelhante aos símbolos da Bentley e da Breitling.

E 3 quadros:

Jan ARP [c.1926], sem título

Pablo PICASSO [1947]Femme au Fauteil

Raymond HAINS [1970] Seita


Assinalei outras 23 obras como de boa qualidade, mas estas 3 eram as que correspondiam ao meu gosto estético.

Na próxima semana publico as conclusões que tirei da leitura dos estatutos da Fundação, que acabam por ser 'o' documento para avaliar o 'negócio' entre Berardo e o Governo, que tanto se discutiu há uns tempos, mas creio que sem grande substância e nenhumas conclusões úteis. Abaixo seguem os devidos links.


Colecção Berardo

Berardo Collections

Museu Colecção Berardo

Decreto-Lei que constitui a Fundação Berardo

Nota Informativa da Presidência da República a propósito do decreto-lei de criação da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Colecção Berardo

PS - porque é que o PIN oferecido, em forma de coração, diz 'Art for Life' e não algo em português?

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