29 julho 2007

Viagens


É Verão, Agosto está a chegar, e isso significa férias para a maioria dos mortais.

'Eu sou daqueles' acusados de elitismo, que não fazem férias em Agosto, e que por detestarem o calorão e a multidão são chamados de todos os nomes, algures entre o lado político right-wing e o 'tem a mania que é bom'. Tenho a vantagem, creio, e para mal do meu ego, de não ser nenhum dos dois.

Uma amiga, que faz sempre uma 'mega viagem' anual, telefonou-me hoje a despedir-se, desta vez vai à Polónia, porque esgotou praticamente os roteiros não europeus. Após décadas de viagens, diz que a Europa é a sua 'reforma': o regresso a casa.

Comentava 'ela' que as 'pessoas' não viajam, que 'ficam no buraco' ou então que fazem férias de 'pacote', sem o país 'genuíno' e que o turismo é em regra o do hotel e piscina ou praia e copos.

Concordo com ela.

Creio no entanto, que a sua opção não é isenta de críticas, tal como a minha [que é ter trabalho e férias tudo ao mesmo tempo, e odiar fazer um mês de férias ou semanas de férias no mesmo sítio] também não.

Claro que não lhe disse nada: teimosa como é -- e como também sou, sei que ela não desistirá -- não vai ligar nenhuma pôr-se aos berros a dizer que eu não sei nada e ela é que sabe, e que viaja, e que é mais velha, e que 'sim'.

A opção 'dela' até agora tem sido a de ir a sítios exóticos, mas em vez de praia, visita ruínas, florestas, montanhas, e na China, por exemplo, claro que foi à muralha, mas o ponto alto foi ter andado de mochila às costas, pelas montanhas.

Na Guatemala, também fez loucuras montanhosas, no Laos, no Cambodja, em São Tomé não foi à praia mas às roças, na Índia prefere tudo o que não seja cidade, e fotografa muitos mercados, e meninos, e meninas, e velhinhos, e velhinhas, e coisinhas, e tralala. E assim faz em todo o lado.

A mania da mochila às costas e da frase 'eu não sou como os que vão para a praia' é o mudar para que tudo fique na mesma, sobretudo para quem acha -- como acha a minha amiga -- que isto dá uma visão abertíssima do mundo, e que só quem faz isto conhece o mundo.

Como se as viagens não fossem organizadas, como se não levasse guias, como se não tivesse guias, como se não tivesse limites culturais, linguísticos, sociais, políticos, naturais.

Nesta perspectiva, continuo a preferir aqueles que não viajam e que dizem nada saber ou querer saber. Não faço isso, mas assusta-me menos do que os me viajam 'muito' e acham que conhecem 'muito': os turistas que dizem que não são turistas, para quem as dificuldades são maravilhas, e acham ser pedagógico não tomar banho uns dias ou, de alguma forma, fazer 'sacrifícios', estilo lição de vida. Não há paciência.


O pacote pode não ser praia, mas não deixa de ser pacote.


É o pacote das grutas e das montanhas, do porco sujo e mau, dos álbuns de fotos 'fantásticas' para mostrar aos 'amigos', que se 'roem de inveja' e com os quais se partilha 'conhecimento' do povo, das tribos, dos locais. A foto do miúdo chinês pobre, que se ri para a foto do ocidental, que é turista e tem uma bela máquina. E assim se põe a foto do miúdo no álbum, da mesma forma que se põe creme no corpo que fica na piscina as férias todas. As férias são colecções de cromos.

Cada vez me convenço que conhecer implica viver, e viver fora de uma redoma, nos locais e com as pessoas, mas vários locais e várias pessoas, de vária extracção. Dir-me-ão que isso é impossível. E eu concordo.

Conhecer não tem nada a ver com férias...

...seja na praia ou na montanha.


O resto não é paisagem: ela é o todo.

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