26 janeiro 2007

A Velha


Podia ser o título de um qualquer quadro ou escultura de época mais ou menos remota, ou simplesmente um título de crónica em revista ou jornal.

É sobre uma velha, que circula entre um restaurante e um bar / disco: a Bica do Sapato e o Lux.

E pede, esticando a mão e balbuciando gementemente.

O parque de estacionamento do Cais de Santa Apolónia é a estrada desta mulher, que umas vezes está junto ao restaurante (início da noite) outras junto ao Lux (noite cerrada). É onde estiverem as pessoas às quais, curvada e caída, enrolada nos seus lenços e rendas e sacos, Verão ou Inverno.

A Velha parece não estar mais velha. É velha, continua velha. Um dia não estará lá, provavelmente por ter morrido. O seu destino final, tal como a sua origem, é desconhecido.

A Velha é uma ponte para a realidade de um país pobre de de um mundo pobre. Miserável, sem higiene, sem oportunidades e [nunca se sabe] sem cultura, pelo menos clássica.

É o contraponto da alegria de quem entra no Lux, do apetice saciável de quem entra na Bica, da bebedeira de quem sai do Lux, da satisfação de quem sai da Bica. Da utilidade da loja de decoração e de ténis e do DeliDelux. E sobretudo, da possibilidade de sair e do destino que tem quem sai do parque.

A Velha é tudo aquilo que nós não somos.

Será sorte? Será azar? Será tabu?

Lorenzetti escreveu sobre ela. Alguma coisa há de ser.