26 maio 2007

Momento precioso,


foi a entrevista de 'Joe' Berardo à RTP2, na noite de 25.05.2007.

É daqueles eventos raros: alguém bem próximo do poder real e intrínseco, vem falar-nos daquilo que se passa num banco do qual é o mais accionista individual [4%], banco esse que é neste momento a maior instituição financeira privada em Portugal.

Um daqueles que pode usar gravada, mas felizmente para ele, não precisa.

Sobretudo, para 'baixar as orelhas' a um dos fundadores do BCP, que Berardo comparou a um Cardeal, Papa in-waiting.

Sendo ele, como se sabe, um verdadeiro waiter.

Jardim Gonçalves pode ser um waiter de luxo em Portugal. Ou um butler. Mas não deixa de ser um, mesmo que alguns accionistas e a sociedade portuguesa o vejam como tal.

Talvez por isso, numa lógica de quem percebe que está velho e que uma OPA rapidamente o põe fora de jogo [porque ninguém acreditou que passar de CEO a Chairman tenha mudado alguma da sua influência nas decisões essenciais do BCP], propôs que a blindagem dos estatutos aumentasse para uns 75% de votos da Assembleia Geral passando, além disso, especiais competências ao Conselho de Supervisão para esse efeito.

A proposta de alteração aos estatutos subscrita por Jardim Gonçalves [subscrição cuja legalidade é posta em causa] escandaliza sobretudo pela possibilidade de o Conselho Geral e de Supervisão, ao qual presiden Jardim Gonçalves, possa nomear livremente a administração e, além disso, ainda tenha poder para ratificar as suas decisões.

Jardim Gonçalves parece estar com medo de uma OPA que o mande para a rua, mais cedo ou mais tarde.

Ou, mais curioso, acha que os actuais administradores executivos, desde logo Teixeira Pinto, enquanto Presidente do Conselho Executivo [ou CEO, como se diz ridiculamente], não andam a obedecer como devem. Ou, se quisermos, a aceitar as 'sugestões' de Jardim Gonçalves.

Basicamente -- e como salienta Berardo -- trata-se de perpetuar a presença de Jardim Gonçalves no banco, ignorando, como inteligentemente [roçando a demagogia, que é no entanto necessária nestes casos] referiu Berardo, os 1500 accionistas do Banco.

Se quiser mesmo ter tanto poder no BCP, não blinde os estatutos nem arranje golden parachutes: lance, ele próprio, Jardim Gonçalves, uma OPA sobre o BCP. Torne-se dono do BCP. É o que qualquer pessoa faz, num mercado livre, se tem interesse em deter algo. No capitalismo compra-se e vende-se. Não se pode ter uma atitude 'squatter', típica de anarquias e ditaduras.

Foi claríssimo que Berardo tentou ganhar o apoio dos accionistas do BCP, contra o seu 'patrício' madeirense.

Sabe-se que isso é difícil: pobre, brando, ignorante, desconfiado e portanto conservador naquilo que não interessa, o povo português -- e necessariamente a maioria dos accionistas do BCP, que mesmo não sendo povo na conta bancária, serão povo pelo menos nas suas cabeças -- apoiaria Jardim Gonçalves. A menos que se identifiquem em Berardo como o grande defensor dos pequenos accionistas [o que se parece estranho por Berardo ser o maior accionista individual do BCP, não é tão estranho pelo facto de ser um accionista individual e não o representante de um accionista institucional].

Porque existe uma estranha 'lealdade ao dono': os accionistas de certas empresas acarinham os líderes históricos como o cão ao seu dono. Mesmo que o dono deixe de dar-lhes comida.

Por isso sempre preferi gatos.

E mesmo que Berardo não venha a ter o apoio dos accionistas, a sua atitude felina conta desde já com o meu.

Porque Jardim Gonçalves, ao contrário da maioria, tem facilidade em ser um reformado de luxo e, como todos nós, tem de perceber que não é eterno e que mais cedo ou mais tarde, perderá faculdades e morrerá.

E porque o BCP é um banco cotado em bolsa e o maior grupo financeiro privado português.

Não a mercearia de bairro do Senhor Esteves.

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