14 julho 2007

Japão



'A arte e a litteratura de um povo constituem duas fulgurantissimas manifestações da alma d'esse povo. Não se pode conceber um povo civilisado, sem uma arte sua e auma litteratura sua; se existisse tal povo, não teria elle alma que valesse a pena mencionar-se; seria um aborto moral.
[...]
O Japão é todo arte. Não se pode dizer que n'elle abundem os artistas, -- seria mesmo um crime pensal-o. -- No Japão, toda a gente é artista. -- N'este paiz, a arte é comparavel a uma emanação, commum a todas as flôres da mesma especie. Mas, afinal, o que é a arte?... Eu sei lá o que é a arte!
[...]
Arte é qualquer d'estes artigos, ainda o mais insignificante, um brinquedo para creanças por exemplo, se o brinquedo guarda a feição typica, nacional. Observando os objectos de loiça para uso commum, á venda nos estabelecimentos da especialidade, arte é o delicadissimo bule para chá, com a sua aza de bambú, que exclue a inconveniencia das queimaduras, servindo o liquido; é a pequenina taça de saké, o vinho indigena, deliciosamente ornamentada; é o bojudo brazeiro, que se enche de cinzas, onde poisam as brazas, de serviço constante no inverno, no comforto dos domicilios; é o jogo de recipientes em forma rectangular, assentando uns sobre os outros, com uma tampa sobreposta, destinado a iguarias diversas, para uma mesma refeição
[...]
Ha uma coisa n'este mundo, inteiramente incompativel com a arte: -- é a sciencia. -- Arte e sciencia são inconciliaveis entre si [...] A arte é mais modesta, contenta-se com pouco; bastando-lhe, em rigor, a inspiração, a chamma do genio a esbrazear dentro do cerebro.
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Wenceslau DE MORAES [1925] Relance da Alma Japonesa, Lisboa: Livraria Bertrand, pp.161-165

Índice:

I - Primeiras ideias
II - A linguagem
III - A religião
IV - A historia
V - A vida na familia
VI - A vida na tribu
VII - A vida no Estado
VIII - O amor
IX - A morte
X - A arte e a litteratura
XI - Synthese dos aspectos
XII - Té onde irá a alma japonesa?

Appendice
A educação no Japão

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