Tragam o Pulitzer.
'Andreia recebida em festa apesar da proibição dos técnicos'
'O excesso de emoções e o aparato mediático marcaram o regresso a casa de Andreia Elisabete, a menina raptada no hospital de Penafiel que ontem todos quiseram ver'
'mal foram transmitidos os noticiários das 13.00 a dar conta da sua chegada, a aldeia de Cernadelo, em Lousada, tornou-se local de romaria para muitos desconhecidos. Alguns até deixaram "a comida na mesa". Insistiam em "ver a menina". E conseguiram.
Pressionada pelos populares, a mãe, Isaura Pinto, trouxe-a duas vezes à janela, para júbilo da população, que batia palmas e gritava pelo seu nome. Algumas horas, críticas e alguns insultos depois, os pais acabaram mesmo por levar Andreia ao local da festa. "Tinha de ser, tinha de ser!", reclamava Mariana Augusta.
Paredes, Penafiel, Paços de Ferreira, Gondomar, Ovar, até de Chaves, gente que "fazia muito gosto em ver-lhe a carinha". Foguetes, "tocadores de cantares típicos", comes e bebes e curiosos fizeram de Cernadelo uma espécie de santuário, com Andreia como atracção. De Fafe chegou mesmo um vidente, que apregoava a previsão do regresso da menina e aproveitou para distribuir panfletos. "Os avós foram lá depois do rapto e eu disse: 'Vai demorar, mas não está em perigo e vai aparecer'", recordou António.
"Vejo aqui gente que nunca vi na vida!", contava Natalina Aurora. Já após o regresso da bebé, a vizinha de Isaura Pinto não fazia questão de se juntar às muitas dezenas que fincaram pé frente à casa da comadre do casal - onde se refugiaram para não expor a criança. "Pouco a pouco, porque isto agora é muita confusão."
O mesmo não pensou Maria Rosalina, um dos rostos dos excessos que pressionaram a família. Mal conseguia falar "com os nervos" a mulher que "não conhecia ninguém", mas viu o caso na televisão e ficou "doente". "O povo fazia gosto que a menina viesse aqui", contou, esbaforida, alguns momentos depois de se empoleirar junto à janela onde a bebé foi mostrada: "Estou aqui com uma dor como se a tivessem roubado a mim." Mas não foi a única. Pedro Santos, um dos muitos que se fizeram ouvir durante o dia, veio de Chaves. "Porque tenho sentimento", disse o homem, que trouxe uma embalagem de 12 litros de leite.
Ao final do dia, Isaura e Albino Pinto acederam em passar tímida e fugazmente com a criança pelo local onde a vizinhança instalou a festa. "Mas ninguém pode tocar nela", avisava um familiar. Os populares - muitos indignados com a possibilidade de isso não acontecer - cumpriram a promessa, cantaram os Parabéns e bateram muitas palmas. A criança passou e a festa continuou. "Vamos comer! Vamos comer!", gritou Pedro Santos. Apesar de admitir "alguns exageros das pessoas", Fátima Couto, amiga e confidente da mãe da criança, não cabia em si de contente: "Estou feliz, sem palavras, foi muito bonito, uma loucura."
Esteé um extracto de uma notícia publicada no DN de 18.03.2007, século XXI.
Quem diria.
Lido distraidamente, pareceria um folhetim de jornal de 1800 em ortografia moderna, sobre algo passado no remoto interior do Minho, Alentejo ou Algarve.
Parabéns aos redactores: este é o Portugal real [com r minúsculo].
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